Peças chegaram em março, mas máquina só será instalada um ano depois.
Rede pública tem 12 aparelhos, mas 4 estão quebrados e sem manutenção.
Enquanto a rede pública de saúde do Distrito Federal enfrenta problemas em 4 dos 12 tomógrafos há mais de dois meses, o Corpo de Bombeiros mantém um aparelho "zero quilômetro" desmontado e sem utilização desde março. A máquina custou R$ 1,6 milhão e foi comprada para a nova Policlínica da corporação – que só deve ficar pronta no ano que vem.
Em nota enviada ao G1, o Corpo de Bombeiros afirma que o tomógrafo foi recebido "provisoriamente" e ainda não foi pago, já que o contrato também inclui a instalação. O procedimento deve ser concluído em janeiro, quando a sala de exames ficar pronta. A inauguração do prédio é prevista para março, segundo a corporação.
A existência do tomógrafo consta em uma recomendação da Promotoria de Defesa da Saúde (ProSUS) do Ministério Público do DF, enviada aos bombeiros no dia 23 de outubro. No documento, o promotor de Justiça Jairo Bisol determinou prazo de cinco dias para que o aparelho fosse colocado em uso na rede pública por empréstimo, cessão ou requisição.
O Corpo de Bombeiros afirma que respondeu aos questionamentos do MP em um ofício enviado em 3 de novembro. O G1 solicitou cópia do ofício aos Bombeiros e ao Ministério Público, mas as duas instituições disseram que não poderiam fornecer o documento.
Equipamentos quebrados
Em nota enviada nesta segunda (7), a Secretaria de Saúde informou que 4 dos 12 tomógrafos da rede pública seguem fora de operação. Os aparelhos estão nos hospitais de Base, Regional do Gama e Regional de Santa Maria. Não há previsão de conserto, já que os contratos de manutenção foram suspensos até a quitação das dívidas de 2014.
A pasta também confirmou ao G1 que o tomógrafo do Hospital Regional de Taguatinga passou dez dias interditado, embora não apresentasse problemas. O defeito estava no ar-condicionado da sala, fundamental para evitar que a máquina tenha superaquecimento. A situação foi normalizada no fim de novembro, segundo a secretaria.
Na recomendação enviada aos Bombeiros, o MP afirma que "sem o equipamento, para tentar salvar vidas, médicos realizam cirurgias às cegas, exploratórias, quase que medievais, havendo, todavia, como se viu, equipamento novo e sem uso, no DF".
Em 15 de outubro, dados da Secretaria de Saúde indicavam que 8,8 mil pessoas estavam na fila de espera por uma tomografia. O número é citado na recomendação do MP. Desde então, a pasta não atualizou dados sobre a demanda reprimida por tomografias.
Só em 2016
Na recomendação, o MP afirma que o contrato para a construção da nova Policlínica "data de 2011, já consumiu mais de R$ 20 milhões e abriu projeto que gerou inúmeras alterações qualitativas e quantitativas". Em nota, os bombeiros afirmam que a obra teve início em 2012 e já previa duração de três anos, por causa da "complexidade, dimensões e especificidade" de uma construção hospitalar.
O texto do Ministério Público também afirma que parte das peças do novo tomógrafo está "no corredor da corporação e outra [parte] no Setor de Radiologia do CBMDF". O G1 foi à área de radiologia da Policlínica e ao Centro de Suprimento e Materiais dos Bombeiros, no Setor Policial Sul, mas não conseguiu informações sobre as peças.
'Irresponsabilidade'
No fim de novembro, o promotor Jairo Bisol disse considerar a falta de manutenção nas máquinas de tomografia "dupla irresponsabilidade" do secretário de Saúde, Fábio Gondim. Na época, três aparelhos estavam inoperantes e um funcionava com 60% da capacidade normal, por falta de resfriamento.
"É uma dupla irresponsabilidade do secretário. A primeira, em não resolver o problema dos tomógrafos no Hospital de Base. Embora tenha experiência de gestão, [Gondim] não tem a menor experiência em assistência de saúde. A segunda, em colocar a culpa nos órgãos de controle, que não são responsáveis pelo orçamento", declarou Bisol. A secretaria informou que não comentaria as declarações do promotor.
O exame de tomografia serve para identificar lesões menores ou anomalias que não podem ser vistas em uma radiografia comum. Ele é mais barato e mais rápido que uma ressonância magnética e ajuda a identificar fraturas, derrames, tumores e problemas em "tecidos moles".
Sem prazo para conserto
Também no fim de novembro, Gondim afirmou em coletiva que não havia prazo para o conserto dos aparelhos. Empresas como Siemens, GE e Philips estariam se recusando a firmar contratos de manutenção, segundo ele, porque têm faturas pendentes desde 2014. A dívida é de R$ 2,4 milhões – correspondente a 0,0004% dos R$ 6 bilhões previstos para a Saúde neste ano.
Em nota enviada ao G1 após a coletiva, o GDF informou que todas as dívidas do ano passado, incluindo as relativas à manutenção de equipamentos, estão enquadradas em um novo cronograma de pagamentos, que não segue ordem cronológica.
Em setembro, o governo publicou decreto informando que só pagaria faturas da gestão passada a partir de julho de 2016. Com isso, as dívidas com fabricantes de tomógrafos só começarão a ser pagas daqui a oito meses, "em até 5 anos ou quitadas antecipadamente, caso o Governo de Brasília possua recursos em caixa."